Trechos da Lei Kandir sobre incidência de ICMS são inconstitucionais
A decisão entre os ministros do STF foi unânime.
Em decisão unânime, os ministros do STF declararam a inconstitucionalidade de dispositivos da LC 87/96, conhecida como Lei Kandir, que previam a incidência do ICMS na transferência interestadual de mercadorias entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte. O voto condutor foi liderado pelo relator, ministro Edson Fachin.
O caso foi julgado em plenário virtual, em votação finalizada na sexta-feira, 16.
Entenda
O então governador do Estado do Rio Grande do Norte, Robinson Faria, ajuizou ação no STF buscando a declaração de constitucionalidade de dispositivos da LC 87/96 (Lei Kandir) que preveem a ocorrência de fato gerador do ICMS na transferência interestadual de mercadorias entre estabelecimentos de um mesmo contribuinte.
Segundo a ação, há diversos precedentes na Justiça afastando a incidência do ICMS na hipótese, contando inclusive com súmula do STJ segundo a qual "não constitui fato gerador do ICMS o simples deslocamento de mercadoria de um para outro estabelecimento do mesmo contribuinte" (Súmula 166). Porém, conforme a ADC, esse enunciado não declara expressamente a inconstitucionalidade dos dispositivos da Lei Kandir sobre o tema. Para o governador, essa circunstância gera instabilidade jurídica e exige o pronunciamento do STF.
Robinson Faria defende que a opção pela incidência do ICMS nessas operações não traz prejuízo para os contribuintes, na medida em que o montante de tributo debitado no estabelecimento remetente é contabilizado no destinatário. Mas faz diferença para o fisco estadual, pois "a operação que envolve estabelecimentos situados em distintos Estados da Federação assegura a cada unidade partícipe parcela da receita tributária", e importa no rateio do ICMS entre os Estados de origem e destino.
Do ponto de vista jurídico, sustenta que o entendimento adotado pelo STJ privilegia o enfoque sobre a circulação jurídica da mercadoria (transferência de titularidade) em detrimento da circulação física (no espaço) ou econômica (ao longo da cadeia produtiva). Segundo o pedido, não é possível encontrar na Constituição Federal base para tal ênfase. "É possível afirmar que as acepções jurídica e econômica da expressão 'circulação de mercadoria' são, ambas, compatíveis com a Constituição", afirma.
Para o governador, contrapondo-se duas interpretações possíveis de uma norma constitucional, é recomendável privilegiar aquela conferida pelo Poder Legislativo, por meio de lei. Isso porque é o Legislativo o ator constitucional com legitimidade democrática para tanto.
Voto do relator
Ministro Edson Fachin, relator, julgou o pedido improcedente, declarando a inconstitucionalidade dos artigos 11, §3º, II, 12, I, no trecho "ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular", e 13, §4º, da LC 87/96.
Segundo o relator, a circulação de mercadorias que gera incidência de ICMS é a jurídica.
"Entendo, assim, que o mero deslocamento entre estabelecimentos do mesmo titular, na mesma unidade federada ou em unidades diferentes, não é fato gerador de ICMS, sendo este o entendimento consolidado nesta Corte, guardiã da Constituição, que o aplica há anos e até os dias atuais."
O ministro ainda complementou:
"Ainda que algumas transferências entre estabelecimentos do mesmo titular possam gerar reflexos tributários, a interpretação de que a circulação meramente física ou econômica de mercadorias gera obrigação tributária é inconstitucional. Ao elaborar os dispositivos aqui discutidos houve, portanto, excesso por parte do legislador."
- Leia o voto de Fachin na íntegra.
O relator foi acompanhado por todos os ministros da Corte.
- Processo: ADC 49
Fonte: Redação do Migalhas
Data: 19/04/2021